Das sirenes de bombardeios da OTAN ao domínio da principal liga de basquete dos Estados Unidos, Jokic é a prova que o sucesso vem da consistência do trabalho construído por anos
Danilo Lacalle Publicado em 12/06/2023, às 15h00
Nikola Jokic não estava nos Estados Unidos quando foi draftado para ser um jogador da NBA. Segundo relatos do próprio irmão, o sérvio não estava nem acordado quando este ligou de Nova Iorque para dar a notícia. Com 21 anos, na época, e 2,10 metros de altura, o pivô estava usando uma camiseta branca do Space Jam em sua cidade natal, Sombor.
“Eu era mais alto do que a maioria dos garotos e garotas, e o mais gordo também. Adorava aulas como matemática, história e não gostava de atividades físicas. No ensino médio, não conseguia fazer uma flexão”, afirmou o sérvio à imprensa norte-americana.
O início pacato do principal nome das Finais da NBA de 2023 vem se desenvolvendo há anos e já mostrou seu potencial quando foi escolhido, por dois anos consecutivos, o MVP da principal liga de basquete do planeta. Inclusive, quase ganhando um terceiro ano, se não fosse por Joel Embiid. Nomeação que ainda assim foi contestada, com boa parte da imprensa e fãs do basquete querendo que o título fosse para Jokic.
Mas a carreira do jogador sérvio começou com um aro de brinquedo, jogando com os irmãos que se abaixavam para ficarem na mesma altura que a estrela da NBA. E, logo aos 16 anos, Nikola saiu de casa para jogar no Mega Leks, time da Liga Sérvia. Em seu terceiro ano, foi nomeado MVP. A essa altura, já havia sido draftado pelos Nuggets, em junho de 2014, mas optou por permanecer no Leste Europeu, chegando em Denver apenas em 2015.
Quando chegou, perdeu 15 quilos antes da estreia na NBA. E na 12ª partida que esteve em quadra pelos Nuggets, Nikola Jokic anotou 23 pontos e 12 rebotes. Números que, para o jogo atual do sérvio, são praticamente nada. E tudo isso aconteceu graças às matérias de jornais.
“Essa história é peculiar porque geralmente todos os jogadores da NBA ou mesmo da Euroliga são descobertos por uma equipe de olheiros que estão percorrendo países, assistem crianças que se destacam jogando e passam a acompanhá-las. Mas ninguém realmente prestou atenção nesse cara”, afirmou Misko Raznatovic, no All The Smoke Podcast.
“Como sou um cara antiquado, gosto de ler jornais, mas não pela internet. Então, todo domingo tem um jornal sérvio com todos os resultados de todo o país e de todas as ligas. Eu estava lendo aquele jornal e vi aquele cara da competição, o Sérvio Sub-18, que é muito baixo, fazendo 29 pontos e, se não me engano, 26 rebotes, e eu disse: 'Nossa'. Na semana seguinte, no próximo domingo, eu estava lendo o jornal de novo e disse: 'Me deixe ver aquele cara.' Então eu vi 30 pontos e 27 rebotes”, acrescentou Misko, uma das figuras mais influentes do basquete na Europa que, como agente, negociou alguns dos maiores negócios europeus e dirige a Agência BeoBasket, que produziu muitos atletas da Euroliga.
Raznatovic ligou para um de seus olheiros para perguntar sobre Jokic, mas este não conhecia Nikola. E na primeira avaliação de Jokic, o olheiro garantiu que o sérvio era “não forte, muito versátil, um pouco acima do peso, sorrateiro, mas talentoso”. Após isso, a família de Jokic recebeu um convite para fazer parte da agência.
Jokic viveu, inclusive, por um período de muitos conflitos em seu país natal. Principalmente quando as tropas da OTAN estiveram na Sérvia durante 1999, quando o jogador tinha apenas 4 anos. Mas este afirma lembrar do barulho das sirenes e dos abrigos antiaéreos.
Mas, na NBA, o progresso de Nikola Jokic passou por cima de todas as adversidades. Logo em seu segundo ano, passou a ser titular nos oito primeiros jogos da temporada. Após isso, foi para o banco de reservas nos próximos 14 jogos. Ainda, nessa temporada, teve um jogo com trinta pontos e outro, em fevereiro de 2017, como o seu primeiro triplo-duplo da carreira, com 20 pontos, 13 rebotes e 11 assistências na vitória por 121 a 117 em cima do Milwaukee Bucks. E, após essa temporada com atuações de gala, Jokic mostrou que poderia ser o nome do Denver Nuggets pelos próximos anos.
Isso não demorou para acontecer quando, ainda no início da temporada seguinte, Jokic anotou 41 pontos em cima do Brooklyn Nets, levando o time à vitória. A atuação eficaz desta temporada fez com que, antes de 2018, o sérvio assinasse um contrato de extensão de cinco anos por 148 milhões de dólares. Algo inimaginável para sua família sérvia, até então.
Logo no jogo 1, contra o Spurs, se tornou o 4º jogador da história da NBA a anotar um triplo-duplo em sua estreia de playoffs. O primeiro nome desde que LeBron James também alcançou o feito, em 2006. Dois anos depois, por dois anos, conseguiu conquistar o título de MVP com atuações memoráveis e levando o Denver Nuggets à pós-temporada. Com isso, não apenas deixou claro que era um dos principais nomes da liga, mas já estava escrevendo seu nome na história.
Agora, em 2023, oito anos após ter sido draftado pelo Denver Nuggets enquanto dormia, o sérvio pode se tornar o principal responsável pelo primeiro título da história da franquia, em sua final inédita. E você acompanha o jogo 5 da série que já está 3 a 1 para Denver, em cima do Miami Heat, a partir das 21h30 (de Brasília) com transmissão do canal ESPN e da plataforma de streaming Star+.
