Sportbuzz
Busca
Facebook SportbuzzTwitter SportbuzzYoutube SportbuzzInstagram SportbuzzTelegram SportbuzzSpotify SportbuzzTiktok Sportbuzz
Futebol / EXCLUSIVO!

Operação Penalidade Máxima e MP: o cenário das apostas esportivas no Brasil

Com a Operação Penalidade Máxima I e II à todo vapor e uma MP nas mãos de Lula, o SportBuzz conversou com Udo Seckelmann para entender o cenário das apostas esportivas no Brasil

Lucas Miluzzi Publicado em 15/05/2023, às 12h21

WhatsAppFacebookTwitterFlipboardGmail
Operação Penalidade Máxima I e II e MP nas mãos de Lula: veja o cenário do futebol brasileiros com as apostas esportivas - Rodrigo Ferreira/CBF
Operação Penalidade Máxima I e II e MP nas mãos de Lula: veja o cenário do futebol brasileiros com as apostas esportivas - Rodrigo Ferreira/CBF

A Operação Penalidade Máxima I e II e a MP nas mãos de Lula se tornaram um dos assuntos mais comentados após o escândalo de manipulação de resultados no futebol brasileiro. Ao longo das últimas semanas, cerca de 16 jogadores se tornaram réus e mais cinco estão na mira do Ministério Público para possíveis investigações. Fora isso, cerca de nove homens também são considerados os principais responsáveis por formar uma quadrilha que tem alterado a ordem do esporte mais praticado do país. 

Desta forma, o SportBuzz entrevistou Udo Seckelmann, mestre em direito esportivo, e que trouxe detalhes das consequências que a Operação Penalidade Máxima I e II podem trazer para os réus, clubes e também apostadores comuns. Fora isso, a Medida Provisória encaminhada ao Governo Federal foi tema de debate. 

De acordo com Seckelmann as casas de apostas esportivas são algumas das grandes vítimas do esquema que expôs uma grande fragilidade no futebol brasileiro. Segundo ele, existe um grande mito em relação ao interesse dessas empresas em querer lucrar com resultados manipulados, algo que as mesmas lutam contra e acabam até com prejuízos milionários.

"Esse é o que chamo de mito número um do mercado de apostas esportivas em relação às pessoas acharem que as casas de apostas estão interessadas em manipular resultados. Isso não é verdade se a gente parar para analisar de maneira fria. Qual é o business da casa de apostas? Ela vende as incertezas dos resultados. Ela com base nisso, ela oferece odds aos apostadores. Quando algum apostador decide manipular um resultado, ele aborda o jogador, oferece um ‘valor x’ e o próprio apostador oferece uma quantia muito alta em cima de uma odd. Se isso não for identificado, a casa de aposta é obrigada a pagar esse valor ao apostador. Então, esse apostador injetou muito dinheiro na odd, e a casa de apostas é vítima direta em relação a isso", afirmou em entrevista exclusiva ao SportBuzz.

CBF
Especialista entende que a proximidade do Governo Federal, com Federações e casas de apostas é a solução (Crédito: GettyImages) 

Udo Seckelmann ainda trouxe os detalhes de como essas casas de apostas operam para tentar evitar que haja manipulação de resultados: "A casa de apostas está interessada em combater a manipulação, pois ela perde cada vez mais dinheiro. Ela também investe dinheiro para monitoramento das apostas e do volume em que elas são feitas. Ela contrata empresas de fora para isso, que analisam o volume de apostas em todos os mercados e, se alguma odd estiver acima do normal, ela acende o sinal amarelo para investigação. Se não tiver uma justificativa plausível para aquela aposta, ela suspende, devolve o dinheiro dos apostadores e essa empresa manda um alerta para a casa de apostas e para a federação para realizar uma investigação mais profunda. Então, a casa de apostas investe nisso e com a regulamentação é capaz que esse tipo de prática de monitoramento ganhe ainda mais força".

Mas e os jogadores que são réus na Operação Penalidade Máxima I e II? O que pode acontecer com eles? 

"Isso é um problema que afeta o mundo todo. No Brasil, existem duas esferas de punições diferentes. Existe uma punição no meio associativo do esporte, em que no futebol especificamente, existe o CBJD, que define as penalidades para quem for pego envolvido na manipulação de resultados. Seja dirigente, jogador ou árbitro, eles podem ser punidos com multa ou suspensão. A segunda esfera de penalidade está estipulada no estatuto do torcedor, que enquadra a manipulação de resultados como crime, que incluiu uma reclusão de até seis anos para o atleta. Então quando o atleta é encontrado a manipular um evento esportivo, ele pode ser punido tanto na esfera do esporte como também na esfera criminal, com penas privativas de liberdade. O atleta pode responder nestas duas esferas e a pessoa que alicia o atleta também pode responder na esfera criminal".

O que podemos esperar da MP das apostas esportivas?  

"Em 2018 a gente teve a legalização das apostas esportivas com quota fixa. Isso foi legalizado para ser explorado pela iniciativa privada mediante a uma autorização do setor público. É necessário obter uma autorização do Ministério da Fazenda para atuar no território nacional, essa é a regra. Porém, essa lei de 2018, legaliza essa atividade, mas não regulamenta a atuação dessas empresas no país. A lei previa um prazo de quatro anos para essa regulamentação e isso terminou em dezembro de 2022. Nada foi feito. Agora entrou o novo governo e essa questão começou a acelerar. Agora temos essa MP para alterar alguns aspectos da lei de 2018, principalmente de cunho tributário, e prestar alguns esclarecimentos em relação a certos pontos que estão meio dúbios.

Essa MP é um complemento para esclarecer certos pontos. Depois desta medida provisória, pelo que foi divulgado, vão sair várias portarias para regulamentar essa atividade. O mercado de apostas não está regulamentado no Brasil. O que aconteceu foi uma alteração com a MP e a partir dela vão surgir novas portarias que aí sim darão início a essas regulamentações efetivas no mercado. Com regras claras para exploração do mercado, quando vão pagar pelo licenciamento e etc".

Quais são os principais pontos que a MP aborda? 

"A MP está alterando alguns aspectos da lei de 2018, especificamente a tributação. A empresa de apostas vai pagar um percentual de cerca de 16% pelo valor que ela arrecada menos o prêmio que ela distribui para os apostadores. Além de toda a carga tributária que existe para as empresas comuns, elas também vão pagar mais 16%. Considerando tudo isso, esse percentual passa de 30% de tributação total em cima das casas de apostas e é algo que é considerado alto, se a gente considerar as boas práticas internacionais.

Segundo ponto, existe também a tributação sobre o apostador. Esse é um assunto bem delicado e que tem sido debate. A tributação, atualmente, está em cima de cada prêmio que o apostador recebe acima do teto de isenção, que está por volta de 2100 reais. 30% disso vai ser retido na fonte pelo operador. O problema é justamente essa tributação é utilizada em loterias.  Então se eu jogo na mega sena e ganho, 30% é retido pelo fonte pela Caixa e 70% é distribuído para os vencedores, e aí já é embutido o imposto. A aposta esportiva não é loteria, é uma modalidade totalmente diferente, que envolve o ticket médio alto ou baixo, mas uma recorrência muito alta de apostas. O apostador não faz uma aposta a cada um ou dois meses e o prêmio também não é cinco mil vezes o que ele aposta, tem as odds específicas para isso. Então a recorrência é muito grande. Então o que acontece, se eu sou o apostador e faço dez apostas em um dia e, no total, numa aposta ganho cinco mil reais e nas outras nove eu perdi um total de dez mil reais. No total desse dia, eu tenho um prejuízo de cinco mil reais e, mesmo com isso, eu ainda vou ter 30% desses cinco mil reais que ganhei retidos. Então assim, o pleito que é feito pelos apostadores é que eles aceitam pagar imposto desde que seja em cima do seu lucro efetivo, não sobre prêmio. Neste caso, por exemplo, eu teria que ter uma espécie de amortização sobre as minhas perdas e, se por acaso, no final do mês eu tive lucro, aí sim eu vou ter esse imposto retido desta fonte. 

Isso é preocupante, pois se a tributação for alta desta forma pelo operador, que no final das contas vai ser revertido para os apostadores, a pessoa vai ter mais despesa, eu vou ter que reduzir o prêmio que pago para os apostadores e com isso são produtos piores e os apostadores ficam menos atraídos pelo mercado licenciado. Além disso, o mercado licenciado também vai tirar 30% do apostador e isso vai dar brecha para que o apostador olhe para o mercado offshore, no mercado que não está licenciado, pois não vou ter 30% retido na fonte e as odds são melhores. Esse é um ponto de bastante preocupação em relação a nossa regulamentação. 

A MP também trouxe um aspecto importante em relação ao mercado não licenciado. Ele vai continuar existindo lá fora, mas nós temos que criar maneiras de desestimular o apostador brasileiro a ir lá fora e apostar nestes sites estrangeiros". 

Quais são as principais falhas na legislação brasileira em relação as apostas esportivas? 

"A nossa legislação engloba já penalidades envolvendo manipulações de resultados.Para a gente combater a manipulação de resultados não basta apenas a legislação. O que temos que fazer é a prevenção, detecção e punição. O pilar número um, que é a prevenção, é algo que no Brasil falta muito. Sem a certeza de resultados não vai existir esporte, não vai existir fã e sem isso não vai existir nada. Prevenção é algo que é necessário. O Brasil não investe como deveria nesta área. Quando a gente fala nisso, é a implementação de problemas de integridade e implementação de educação aos participantes.

Nós falamos isso, pois muitos atletas, em sua grande maioria, vem de uma baixa escolaridade, de família mais humilde e etc, eles não têm conhecimento das regras específicas sobre isso. Então ele não sabe diferenciar quando ele está na categoria de base, com 12 anos, numa condição precária, ele ganha uma chuteira do seu agente, e ele não sabe diferenciar o que é um presente do seu agente ou valor de cinco mil reais de um amigo próximo que pediu para tomar um cartão na partida. Então assim, existe essa ausência de educação em relação as regras, do que os atletas podem ou não fazer em relação as apostas. Eles não sabem quais as consequências disso tudo.

Muitas vezes, o atleta acha que o cartão amarelo não vai influenciar na partida, mas tem problema. O regulamento é claro em relação a isso, as punições são duras em relação a isso. Você pode ser suspenso e pode ser preso. Dar esse tipo de educação para a conscientização dos atletas e árbitros é algo que tem que ser disseminado. Isso aí é investido pelas grandes ligas há muito tempo. A Premier League, a La Liga, a NFL… Todo mundo investe e acho que o Brasil vai começar a investir nisso. Sempre vão existir apostadores para tentar se beneficiar de resultados e os atletas vão sim ser sempre abordados para fazer isso. Cabe a nós investir em prevenção para os atletas e árbitros não aceitarem o suborno. Esse é o primeiro passo, que é fundamental".