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Especialista em e-Sports faz análise do desenvolvimento no Brasil e crava modalidade nas Olimpíadas no futuro: "É inevitável"

Pedro Oliveira, co-fundador da OutField Consulting, já realizou vários projetos de esporte eletrônico no país e enxerga bons frutos por vir

Marcello Sapio Publicado em 20/01/2021, às 17h45

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O mercado de e-Sports no Brasil, apesar de volumoso, ainda é pouco explorado - Getty Images
O mercado de e-Sports no Brasil, apesar de volumoso, ainda é pouco explorado - Getty Images

Os e-Sports já conseguiram ultrapassar a discussão de são, realmente, esporte "de verdade" ou "não".

Esses esportes eletrônicos, não têm, somente, grandes números de audiência, mas como de receita, consolidando-se ainda mais no mercado e nos noticiários esportivos, ao lado de futebol, basquete, entre outros.

E nesse ano de 2020, equanto os esportes tido como "tradicionais" se viram obrigados a parar, os jogos eletrônicos, com campeonatos, streams e lives ocuparam boa parte do tempo dos telespectadores.

O SportBuzz conversou com exclusividade com Pedro Oliveira, co-fundador da OutField Consulting e especialista no mercado de e-Sports.

Torneio de e-sports (Getty Images)

O RETRATO DO E-SPORTS ATUALMENTE

O movimento dos esportes eletrônicos passaram muito, em um primeiro momento, pela entrada dos clubes de futebol, como Flamengo e Corinthias, em suas respectivas modalidades.

Apesar do sucesso das duas equipes mais populares do país, esse movimento ainda é considerado baixo, pelo menos nos clubes de elite. Pedro comentou sobre isso.

"Tem algumas visões diferentes no movimento. A gente participou ativamente desse processo, estivemos à frente do projeto de e-Sports do Flamengo, durante 8 meses, entre 2019 e 2020. Por conta disso, fomos procurados por vários clubes de futebol, no qual prestamos consultoria e outros temos a relação de amizade. A gente vê uma imersão grande dos clubes no mundo dos e-sports. No mundo do futebol, tudo que seja fora no espectro deles, que é montar um elenco e disputar campeonato, eles olham com uma visão simplista de toda a coisa: O esporte eletrônico como uma oportunidade de gerar receita para poder gastar com o futebol e eles não estão pensando no planejamento, na construção de marca, no diálogo com o público", disse.

Ele ainda completou: "É uma visão generalista, nem todos os clubes são assim, mas é o que acontece historicamente, tudo que foge do campo, eles tentam terceirizar para tirar o mínimo de royalties. Pra gente, é uma visão míope. Os clubes que fizeram movimentos mais alinhados, colheram frutos muito interessantes, como Flamengo e Corinthians. Existe uma oportunidade enorme para os clubes de futebol, mas precisa ser bem-feita e de uma forma acertada, focando no projeto como um todo”.

Pedro, em sequência, também analisou que, muito dessa "pouca entrada" se dá pelo pré-conceito que ainda existe nos esportes eletrônicos.

Ele cita que é necessária uma maior aceitação dentro dos veículos mais tradicionais, mas também vê como um movimento natural, daqui a alguns anos: "Cada vez mais a discussão está superada. Mas ainda existe um pré-conceito e que, por uma falta de conhecimento, falta esse espaço na tv aberta. O Brasil ainda está meio longe disso. Uma comparação que pode ser feita é com a Champions League na década de 1990. Ela já era uma liga super atrativa, com Romário, por exemplo, mas era muito nichada na tv à cabo, que acompanhavam. Com o tempo virou essa febre global, com espaço na tevê aberta, mas isso só aconteceu no Brasil em 2007, 2008, quando a Globo comprou os direitos".

"Eu vejo o e-sports seguindo o mesmo caminho, com transmissões que começaram no cabo há uns 3, 4 anos atrás e hoje os canais como SporTV e ESPN com calendários consistentes. Então eu sinto que vai ser uma programação natural. Até porque a população que consome os e-sports hoje está envelhecendo e a tevê aberta precisará fazer essa adaptação para esse público, competindo com as formas de streaming, que já estão super consolidadas, como a Twitch, o Facebook Gaming e o Youtube Gaming. Se os canais abertos e fechados não começarem a produzir esses conteúdos, o público não vai migrar para lá. E-sports na tevê aberta é inevitável”, complementou.

Como dito acima, nesse período de pandemia, tanto os e-sports quanto as plataformas usadas paras as transmissões bateram recordes expressivos, mostrando a força desse movimento.

Pedro disse o que pensa sobre esses dados e como os esportes eletrônicos ainda podem se consolidar, como um todo: "A pandemia trouxe um tempo de experimentação do produto e-sports. Naquele momento, entre abril e junho, quando houve o lockdown global e aquela zona obscura na qual não havia nenhum conteúdo esportivo ao vivo, a população migrou para os streamings, seja os de entretenimento, mas também para o mundo dos e-sports. Aquele blackout fez com que um público que não consumia os esportes eletrônicos começassem a se interessar pelos conteúdos. Não foi à toa que, nesse período houve várias quebra de recordes de audiência em transmissões".

Ele ainda profetizou: "Creio que em 2021 teremos ainda altos números, mas o principal desafio será monetizar esses conteúdos, como os desenvolvedores dos jogos, que fazem os campeonatos, vão se readequar para esse novo público, para que continuem consumindo, mesmo após a pandemia. Eu sou muito otimista".

Campeonatos de e-Sports atraem muita audiência (Getty Images)

OLIMPÍADAS? O FUTURO DOS E-SPORTS

Os esportes eletrônicos têm tudo para se consolidarem como uma modalidade consistente.

Tido popularmente como "o esporte do futuro", já se discute, em veículos mais liberais, uma possível entrada dos e-Sports no cronograma dos Jogos Olímpicos, tendo em vista que um dos desafios do COI é rejuvenescer o seu público.

Nos últimos cronogramas, foram inseridos esportes mais "jovens", como a escalada, o skate e o surf.

Pedro analisou essa possibilidade e entende que é questão de tempo para que sejam integrados aos programas olímpicos: "É inevitável. Acho que temos que entrar na conversa de ‘quando vai acontecer’ e não do ‘se vai acontecer’. Porque no final, o movimento olímpico tenha ainda a imagem dos atletas, do movimento, da qualidade de vida, os esportes eletrônicos já mostraram, se trabalhados da maneira certa, para alto rendimento, para a formação, não só de atletas, mas como de pessoas, muito eficientes. A gente já enxerga movimentos como na Ásia, por exemplo, com os e-Sports fazendo parte dos jogos Asiáticos, embora o Comitê Olímpico esteja reticente, com uma visão simplista, até preconceituosa, que são compactuadas pelos esportes mais tradicionais, falando que os e-sports não é um esporte de verde, mas basta você fazer uma imersão na rotina de qualquer atleta profissional para ver o nível de concentração, de rendimento, de estresse que eles passam. São atletas de alto nível. Precisa haver um processo de educação nas pessoas que têm a tomada de decisão, passando pelos comitês regionais, nacionais e internacionais".

Ele também fez uma "previsão" de quando poderemos ter essa inserção: "É um processo de convencimento. Se fosse para prever, eu acredito que possa ter um tipo de experimentação em Los Angeles, em 2028. Não sei se seria um esporte de medalha. Mas por ser no mercado americano, que até lá será a maior potência mundial, além da abertura comercial, acredito que possam aproveitar essa oportunidade”.

PROGNÓSTICO PARA O BRASIL

Pedro além disso, contou quais são as suas expectativas para o mercado brasileiro na questão dos e-Sports, para 2021: “Eu enxergo de dois lados os e-Sports no Brasil. Falando de dentro para fora, eu ainda não sou otimista porque as marcas ainda não se atentaram no tamanho da oportunidade que o mercado dos games entrega, quando a gente olha para os investimentos de mídia das grandes empresas e agências de publicidade, mais de 50% vai para a tevê aberta, sendo que nem sempre o público consumidor está lá e essa migração está lenta, tanto para o digital quanto para as outras plataformas, como o próprio esporte eletrônico, ferramentas de entretenimento. Eu ainda sou meio pessimista com essa verba de publicidade nos jogos eletrônicos porque vem acontecendo muito lentamente. É um gerúndio eterno das grandes marcas nessas novas oportunidades ‘estamos vendo’, ‘estamos entendendo’... e esse gerúndio nunca muda."

Por outro lado, o consultor vê com bons olhos o desenvolvimento do esporte no Brasil, de uma perspectiva dos clubes: "Da mesma forma que eu sou pessimista sobre as marcas, eu sou muito otimista em relação ao desenvolvimento dos times como plataformas, não só competitivas, como também de entretenimento. Temos vários exemplos de sucesso, como a Fúria, que começaram como equipe e começaram a produzir conteúdos de entretenimento voltados para várias plataformas. A LOUD é outra, só que foi o caminho inverso. Eu enxergo um ano de 2021 muito decisivo para os clubes, em um momento de consolidação. (...) A gente vai chegar num momento em que existem 10, 15 times consolidados em diferentes jogos, até um movimento de fusão, para algo mais próximo do que acontece no mercado global".

Mulheres, apesar de serem a maioria em consumo de games, não ganham espaço no âmbito profissional (Getty Images)

AS MULHERES NOS E-SPORTS

Como em qualquer camada da sociedade, as mulheres ainda não conseguem ter oportunidades igualitárias no mercado.

No e-Sports, apesar de terem uma evolução notória, ainda há um longo caminho a se percorrer. Pedro falou sobre essa problemática, não só dos e-Sports, como da sociedade e que é otimista em relação ao tema.

"Tem duas formas de enxergar esse contexto. Existe sim o preconceito com as mulheres dentro do esporte eletrônico, mas infelizmente é um reflexo da sociedade. No esporte tradicional não é diferente, até tem se visto cada vez mais as discussões a respeito do futebol feminino, tanto do ponto de vista financeiro como um tratamento. Os e-Sports acabam trazendo essa ‘herança’. O ponto positivo dos esportes eletrônicos é que estamos falando de uma comunidade mais jovem e que está mais disposta a debater sobre esses assuntos. Os games têm essa pegada se ser uma comunidade, para o bem ou para mal, e quando sentem a necessidade de discutir sobre um assunto, eles o fazem, como por exemplo a desigualdade de gênero, o que não acontece na mesma frequência nos esportes tradicionais, como o futebol, no qual ainda existem inúmeros tabus e parecem não ser discutidos, abordados e resolvidos. Mas dentro dos e-sports ainda há muito que melhorar. Muitas mulheres precisam jogar com apelidos e nomes masculinos para não sofrerem com comentários preconceituosos, mas por serem pessoas mais jovens, existem esses movimentos de debate", disse.

Ele ainda completou: "Ainda tem um bom caminho para que seja traçado, mas é uma comunidade mais aberta ao debate. Tem um papel muito importante das desenvolvedoras . Elas precisam fomentar a participação feminina, já que, no âmbito amador, sabemos que as mulheres são a maioria do público consumidor, seja no celular, no console e no pc. Ainda há esse desafio das desenvolvedoras, já que elas são as responsáveis pelo jogo, existe a necessidade de serem propositivos, de que tragam ideias, o que está sendo feito".

Uma singularidade dos e-Sports também são os torneios mistos, ou seja, permitem a participação de homens e mulheres na mesma competição. O que pode ser amplamente interpretado.

Pedro, por fim, comentou sobre os torneios mistos e cita uma "herança" dos esportes tradicionais ao separar por gênero: "Os e-Sports copiaram muito, na estrutura, os esportes tradicionais, no quesito de copiar o que tinha de mais bem-sucedido. Olharam o que o futebol fazia e aconteceram situações um tanto quanto curiosas, como por exemplo a de patrocínio, que no futebol, a área nobre é no peito, mas começaram a perceber que, nos e-Sports, essa área não aparecia nas lives, nas streamings e nos torneios, então a omoplata virou a ‘área nobre’, e essa questão de participação trilhou o mesmo caminho. Copiaram modalidades em que os homens e as mulheres estão desde sempre separados, mas acho que agora a gente pode enxergar equipes mais competitivas com homens e mulheres juntos e eu sinto que vai acontecer mais”.

Hoje não existe uma regra definida dos campeonatos serem exclusivamente masculinos ou femininos, as desenvolvedoras não colocam nenhuma trava nesse aspecto. Inclusive, há vários casos de mulheres que disputaram torneios importantes junto aos homens. Na Europa e na Ásia tem até o caso de terem equipes 100% femininas disputando campeonatos contra equipes masculinas, então já tem algumas situações de torneios mistos. Eu sinto que isso vai continuar no quesito mais de a indústria estar mais pronta para seguir esse padrão", finalizou.